A Fonte do Equilíbrio (Parte 1/2)

| 13 junho 2015 |


Eu corria desesperadamente, como se a minha vida dependesse daquilo. E realmente dependia. E não era só por mim que eu estava correndo tão precipitadamente por aquela floresta sem fim. Era por mim, pelo equilíbrio, pelo universo e por “ele”.

Eu nunca imaginei estar realmente naquele lugar, vivendo aquele momento, apesar de tantas vezes antes já ter estado ali. Até aquela manhã, meus sonhos eram apenas sonhos e não passavam disso, por mais reais que eles parecessem. Aquela floresta sombria, uma pedra brilhante que eu nunca soube para o que serviria e um garoto em pleno sofrimento, que fazia com que meus sonhos se transformassem em pesadelos.

Agora eu sei, agora eu entendo que, toda a noite em que ele aparecia, por minha ajuda que ele pedia. A sua agonia se tornava a minha, seu sofrimento era tão grande que me fazia sucumbir as lágrimas, mas, quando a manhã surgia, minha mente voltava à realidade e esquecia o pranto do garoto em minha mente. Porém, os meus sonhos foram ficando cada vez piores e passei a pensar neles durante o dia. Quanto mais obcecada eu ficava com o que em via em meus sonhos durante a noite, mais reais eles se tornavam. Foi quando alguém soube que eu estava preparada. No momento em que, mesmo durante o dia, aqueles olhos escuros e marejados era tudo o que eu via, foi quando "a pedra" realmente surgiu em minha vida.


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Eu sempre tive um espírito aventureiro, mas aquela floresta me dava arrepios. Não saberia dizer se eram as árvores muito juntas, o vento que parecia sussurrar em meus ouvidos ou a sensação inquietante de estar sendo vigiada, mas eu detestava estar naquele lugar. Tudo o que eu mais queria era ir embora, o mais rápido possível. Isso seria exatamente o que eu faria, mas não podia ignorar quando ouvi um lamento de cortar o coração que parecia vir de um lugar bem próximo a mim.

Todos os meus instintos diziam para eu me afastar, mas, por mais que eu estivesse com medo, não poderia abandonar a própria sorte alguém em tamanho sofrimento. Andei com passos vagarosos, prestando atenção a cada ruído, tentando não ser notada, ao mesmo tempo em que a floresta parecia focalizar seus milhões de olhos em mim. Os ruídos ao meu redor diminuíram na mesma intensidade em que o choro crescente e ininterrupto se elevou. Eu estava perto.

Cheguei a uma grande árvore, a maior que eu já tinha visto em minha vida, algo quase impossível de sequer se imaginar. Ela era majestosa, bela e terrível ao mesmo tempo. Seriam necessárias muitas pessoas para conseguir abraçar aquela coisa monstruosa. Seu casco era quase negro, como se houvesse sido queimada, mas ela estava viva, muito viva. Eu não sei explicar como eu sabia disso, na melhor das hipóteses, eu podia sentir a vida pulsando naquele ser gigantesco.

Nada havia me apavorado tanto até aquele momento. Algo assim não deveria existir. Não com esse tamanho, não com essa sensação de plena existência, que até hoje eu só tinha sentindo em outras pessoas. Eu dei um passo para trás, me preparando para correr na direção oposta, quando uma voz chamou minha atenção.

- Não vá, por favor. - Disse uma voz muito baixa, sussurrada. Era possível perceber a força que era necessária para dizer aquelas poucas palavras - Me ajude.

Eu olhei para todos os lados, esperando encontrar o dono daquela voz, mas, quase que conduzida por algo mágico, minha atenção se desviou para o centro da grande árvore.

Havia a metade do corpo de um garoto saindo daquele tronco monstruoso. Ele estava totalmente preso, como se toda a parte de trás de seu corpo tivesse sido sugada pela árvore. Suas pernas quase não podiam ser vistas, o seu tronco se fundia ao da árvore e a cabeça se ligava a ela de forma inquestionavelmente terrível. Seus braços abertos e, com sua cabeça forçada para cima, ele era obrigado a forçar o olhar para baixo para se comunicar comigo. Tudo parecia lhe causar muita dor.

- Me ajude. - Parecia ser tudo o que ele conseguia dizer.

Eu dei um passo em sua direção, sem saber ao certo o que fazer, mas sem poder observar aquilo nem mais um minuto sem fazer nada.

Foi então que eu acordei.

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Dei um murro no travesseiro devido à minha frustação. Por que eu nunca conseguia chegar perto? Por que eu sempre acordava antes de salvá-lo?

Esse sonho me perseguia há meses, quase sempre com o mesmo começo e o mesmo final. A floresta assustadora, aquela árvore gigantesca e o garoto preso a ela. A única coisa que parecia mudar era a quantidade do corpo do garoto dentro da monstruosa árvore. Na primeira noite em que eu sonhei com ele, se não fosse a aparência de estar sentindo dor, ele pareceria apenas um garoto bonito, encostado em uma árvore, como que flertando comigo. Agora, mais da metade de seu corpo parecia ter sido engolida e eu nunca conseguia chegar até ele.

Me levantei e tentei me espreguiçar, para espantar a preguiça e qualquer pensamento sem sentindo, mas sabendo que passaria mais um dia sem conseguir tirar aquele sonho dos meus pensamentos.

Quando sai de casa para ir trabalhar, um arrepio único percorreu a minha espinha. Por um momento pensei ainda estar sonhando, mas sabia que isso não era possível, o que me apavorou ainda mais ter aquele pressentimento. Senti a mesma sensação de estar sendo vigiada que sentia na floresta e somente na floresta. Aquilo me deixou tremendamente espantada, pois nunca havia acontecido enquanto eu estava acordada.

Olhei para os lados, apenas para me certificar que aquilo não passava de um surto da minha imaginação. Mas, não pela primeira vez, minha vista foi direcionada para um ponto especifico e o que eu vi fez meu coração parar.

Havia um homem olhando diretamente para mim, me encarando sem nenhuma cerimônia, como um velho amigo faria, mas sem a expressão amistosa em seu rosto. É claro que isso não seria nenhum absurdo se ele fosse um homem normal, mas ele não era. Sua aparência era de uma pessoa comum, não havia nada em seu corpo que o denunciasse, mas eu "sentia" aquele homem de uma forma completamente diferente de pessoas normais.

Eu sempre pude sentir todos a minha volta. Para mim, aquilo sempre foi algo normal, tanto que nunca tratei daquilo com ninguém. Era apenas uma sensação, como sentir seu coração batendo, algo normal e natural, que não exigia questionamentos. Foi um tanto espantoso o dia em que eu percebi que as pessoas não se sentiam, que eles precisavam usar algum de seus outros sentidos para perceber alguém. Desde dia em diante, eu soube que eu era diferente, que eu tinha algo especial. Algumas pessoas chamariam essa sensação de poder ou dom. Eu nunca sequer tive vontade de descobrir as origens de algo tão enraizado em mim e tinha pavor de que alguém me julgasse por ser diferente, então, sempre guardei aquilo dentro de mim. Não precisava olhar para saber que havia alguém ao meu lado. Nunca achei estranha aquela sensação. Era como se a vida pulsasse em cada ser vivo do planeta. Era como sentir o corpo quente de alguém ao seu lado e saber que aquela pessoa respirava, mas com um pouco mais de intensidade.

Mas, encontrar com aquele homem foi a maior prova de que eu era diferente. Enquanto ninguém parecia se importar com aquele ser parado ali, eu estava quase que paralisada com aquela sensação que emanava dele. Aquele homem transmitia algo estranho. Eu mesma não entendia o que eu estava sentindo, mas se tivesse que definir em uma palavra, eu sentia como se aquele homem fosse velho, e quando eu digo velho não me refiro a alguém de 100 anos. Muito mais do que isso. Algo que me apavorava.

Eu nunca fui atrás da origem dessa minha diferença, porém, não poderia deixar que o medo me fizesse perder uma oportunidade de descobrir algo, quando ela estava batendo a minha porta. Não era exatamente boa a sensação que eu sentia, mas fui em direção daquele ser, e ele começou a andar na direção contraria quando viu que eu me aproximava. Não entendi porque ele se afastava, pois parecia quase satisfeito com a minha aproximação. Um leve sorriso em seus lábios o denunciou. Fiquei com medo por ele querer que eu o seguisse. Talvez não gostasse do que eu fosse encontrar no final do caminho.

Ele entrou em um beco e eu o perdi de vista por um momento. Corri para tentar alcançá-lo, mas quando cheguei no último lugar que o tinha visto, o homem havia sumido completamente, mas a sensação que eu sentia em sua presença não havia ido embora. Eu olhei para os lados, procurando algum sinal de onde ele teria se escondido, quando um brilho chamou minha atenção. No chão cinza, todo coberto de concreto, eu vi uma pequena pedra luminosa, que tomou toda a minha atenção.

Ela era linda. Parecia um sacrilégio ela estar ali, largada, como se desprezada sem razão. Não conseguia pensar em mais nada, apenas na sua beleza e como ela deveria pertencer a um lugar mais nobre do que um beco no meio do nada. Eu me abaixei e, um segundo antes de tocar a pedra, uma sensação forte, como se algo estivesse apertando meu coração, me invadiu, mas já era tarde demais. Eu toquei e pedra e meu mundo desapareceu.


PARTE 2

6 comentários:

  1. Muito lindo e misterioso ao mesmo tempo, muito bem elaborado parabéns.

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  2. Gostei muito desse conto, super bem elaborado, parabéns, na espera da segunda parte!

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  3. Parabéns! O conto está realmente "delicioso". Amei ler cada linha, parabéns de novo hahaha.
    Beijos,
    apenasumaleitura.blogspot.com.br

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    1. Muito obrigada, Mariana!
      Espero que você também goste do desfecho :D

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