Você sempre estará em meu coração

| 11 abril 2015 |
“Você sempre estará em meu coração. Não importa o que aconteça.”

Aquelas foram as suas últimas palavras, entalhadas sem vida em um papel vazio. Vazio de cor, vazio de vida, tão vazio quanto meu espírito naquele momento. Palavras jogadas apenas para serem levadas pelo vento.

Como ela poderia escrever aquelas palavras se estava me abandonando? Se depois de tudo o que nós passamos juntos eu teria que enfrentar sozinho o mundo, mesmo depois dela ter prometido que estaria sempre ao meu lado.

Que caminhos foram esses que nós tomamos que nos levaram a uma separação tão imprevisível?

Sempre que imaginei meu futuro, era ela quem estava ao meu lado, assim como no dia em que nos conhecemos. O momento de maior dor de nossas vidas.

Ela estava sozinha, nervosa, parecendo que iria chorar por não ter ninguém ao seu lado. Eu também estava sozinho, lidando como podia com a minha própria dor. Era noite de Ano Novo. Todos felizes, comemorando e se enchendo de esperança por um ano que seria fantástico, a tradicional esperança que acompanha todo fim de ano.

Para mim, aquela noite começaria e terminaria em meio à tragédia e a dor. Mas, eu não estava sozinho. Aquela estranha, de vestido prateado, que outrora devia ter idealizado há essa hora estar fazendo sua contagem regressiva, cheia de alegria, estava agora ao meu lado, no frio saguão de uma delegacia, esperando a sua vez, tentando não sucumbir às lágrimas que iriam trazer à tona a dor que ambos estávamos sentindo.

Quando nossos caminhos se cruzaram, não poderia ter sido pior. 

Laura estava ao meu lado, no banco da frente. Ainda era muito cedo para ter loucos bêbados àquela hora na rua, pelo menos era o que eu pensava. Como eu me culpava por estar tão errado. Eu estava feliz, sossegado, dirigindo calmamente em direção à casa dos meus pais, onde comemoraríamos o ano novo, exatamente quando um motorista bêbado entrou na pista ao lado, na contramão. O carro que vinha em sua direção virou bruscamente, apenas para não acertar o bêbado enlouquecido, invadindo a nossa pista, mas, o nosso carro estava exatamente em sua direção. Ele acertou o lugar em que Laura estava. Não houve tempo nem de levá-la ao hospital.

O motorista do carro que tentou desviar também ficou gravemente ferido, mas foi levado para o hospital. Nós estávamos na delegacia quando ela recebeu a noticia. Vários termos médicos incompreensíveis que queriam dizer uma única verdade incompreensível para qualquer ser humano.

Ela balançou a cabeça compreendendo, mas sem conseguir assimilar o tamanho da tragédia. Eu pude entender que era seu pai que estava ao seu lado. Aquele que bateu diretamente em minha Laura. Eu sabia que culpa não era dele, era do louco bêbado que fugiu e até agora não tinha sido encontrado, mas, por um momento de pura raiva, eu pensei que ele mereceu o que tinha lhe acontecido.

O olhar dela ficou fixo durante muito tempo em uma parede, até que o muro que ela tinha erguido a sua volta finalmente se rachou, e suas lágrimas começaram a desabar sem resistência.

Aquele era um lugar frio e insensível, em que provavelmente todos estavam acostumados com lágrimas alheias, portanto, não se importariam com mais uma jovem que perdeu alguém da família chorando. Alguém que provavelmente só estava estragando ainda mais sua noite de ano novo, portanto, eu era o único que restava. Além disso, se envolver com a dor de outra pessoa, talvez fizesse com que eu esquecesse um pouco da minha.

Ela não se importou que eu a abraçasse, na verdade, aquilo parecia ser tudo o que ela precisava naquele momento, e eu pude fingir, mesmo que por uma fração de segundo, que era a minha Laura que estava novamente ao meu lado, e que tudo estava bem.

Após esse dia, nós compartilhamos as nossas tristezas, o que por alguns momentos pareceu diminuir aquela enorme dor, mas também começamos a compartilhar as alegrias. Foram tantos momentos maravilhosos, que pareciam ser completamente corretos, mas nunca perfeitos. Eles sempre eram ofuscados pela lembrança do momento que nos uniu.

Era como uma sombra pairando sobre nós. Ela sempre dizia que me amava, mas que estar comigo era sempre ter que se lembrar do que tinha acontecido. Sempre sentir como se nunca pudesse deixar aquele dia para trás.

Eu deveria ter visto o que estava acontecendo. Ela estava cada vez mais triste. Olhava em minha direção e seus olhos se enchiam de lágrimas. Dizia que me amava, me abraçava, e eu enxugava o seu pranto.

Eu deveria ter previsto que tudo levaria a isso, e agora, eu estou novamente sozinho.

“Você sempre estará em meu coração. Não importa o que aconteça.”

Nenhum comentário:

Postar um comentário