Meg estava praticamente correndo pelos corredores. Ela era
provavelmente a única aluna que ainda estava na escola até aquele horário. O
vestibular a estava enlouquecendo, ela tinha certeza. Mal se lembrava de comer
ou dormir e agora, ao que parecia, não se lembrava nem de ir para casa.
Quando já estava quase na saída, ela percebeu uma
movimentação no corredor onde ficava o jornal estudantil. Parecia que aquele
pessoal também levava o seu trabalho muito a sério. Meg já ia continuar o seu
caminho, quando algo lhe chamou a atenção.
Ela ouviu um ruído baixo, involuntário. O som de alguém
provavelmente assustado com algo, tentando segurar as próprias lágrimas. Sem
poder se conter, ela seguiu com passos suaves pelo corredor. Todas as salas
eram abertas na parte superior, onde terminavam em grandes janelas. Sem saber
ao certo o que ocorria, Meg posicionou, em silêncio, uma cadeira perto da
parede e subiu, se equilibrando cuidadosamente.
Infelizmente, aquela altura não era suficiente para que ela
realmente visse o interior da sala do jornal, mas ela podia ouvir melhor o que
acontecia ali dentro. Parecia não haver luz nenhuma acessa, o que ela achou
muito estranho. A luz do corredor mal iluminava o lado de fora, quem dirá o
lado de dentro.
O choro parecia muito mais alto agora que ela estava bem
próxima. Era claramente um garoto que estava naquela situação. Ela pensou
em entrar para perguntar se estava tudo bem, até ouvir uma voz arrepiante, que
quase a derrubou da cadeira.
- Você não disse que era isso o que mais queria? Que esse
era o seu destino? - Meg sentiu um calafrio percorrer a sua espinha ao ouvir
aquela voz assustadora, fria e claramente masculina.
-Eu sei. - Disse o garoto, que agora parecia fazer muito
esforço para segurar as lágrimas. - Mas estou com tanto medo, eu não sei
mais se quero isso.
- Você sabe a verdade, agora não tem mais volta, ou se
junta a nós, ou…
Aquele “ou”, jogado no ar, foi à coisa mais assustadora
e misteriosa que ela já tinha ouvido.
O menino que chorava estava sendo ameaçado,
isso era óbvio. Ela deveria descer dali e ir atrás do zelador, ou de algum
segurança, mas a sua curiosidade a mantinha presa no lugar.
O volume do choro aumentou consideravelmente e, junto com
ele, vieram risadas de outras pessoas. Era possível perceber que, além do
menino chorão, havia pelo menos mais três pessoas ali dentro. Ou pelo
menos havia três pessoas rindo do sofrimento do garoto.
Seu choro foi interrompido bruscamente junto com as risadas.
Um grito cortou o ar. Meg sabia que o choro e o grito tinham
partido da mesma pessoa. Foi um grito alto e estridente, porém, rápido. Agora,
ela não ouvia mais nada além da própria respiração acelerada. Meg queria
descer da cadeira, mas suas pernas não obedeciam aos seus comandos.
Pareceu uma eternidade até que ela voltou a ouvir algum som. Eles estavam andando
até a saída. Meg não fazia ideia do que estava acontecendo, mas tinha
certeza que não queria ser a fonte dos próximos gritos.
Com as pernas tremendo, e com mais barulho do que gostaria,
ela desceu da cadeira e correu para o corredor que levava em direção
as salas de aula. Era mais perto e ela tinha certeza que eles iriam
em direção à saída. Com o coração parecendo que iria saltar no
peito, ela virou o corredor e se encostou na parede. Só voltou realmente a
respirar quando ouviu os passos se afastando, como ela imaginou,
em direção a saída.
Depois de vários minutos, para tentar se acalmar e garantir
que eles tivessem partido, ela finalmente voltou pelo mesmo corredor. Não
havia mais ninguém ali. A sala do jornal estava aparentemente vazia. Sua
curiosidade era irritante, mas ela não conseguia se controlar. Tentou abrir
a porta, sem sucesso, porém, havia algo na maçaneta que manchou os seus
dedos. Algo que devia estar na mão de quem fechou a porta. Ela aproximou a mão
dos olhos para poder ver claramente. Em seus dedos tinha algo vermelho e bem
característico, muito parecido com sangue.
______________________________________________________________________________
Meg mal percebeu como chegou até a sua casa. Parecia que em
um segundo ela estava na escola, e no outro deitada em suas cobertas, ouvindo
as batidas rápidas do seu coração. Normalmente ela estaria estudando um pouco,
porém, ela não conseguia pensar em mais nada.
Sua mãe ainda não havia chegado em casa. Seus plantões eram
imprevisíveis e como Meg também quase não parava em casa, ou estava trancada no
escritório estudando, pareciam séculos desde a última vez em que mãe e filha
tinham passado algum tempo juntas, mas tudo o que ela desejava naquele momento
era poder compartilhar com sua mãe o que havia acontecido.
Por mais que estivesse assustada, o cansaço era seu único
companheiro fiel naqueles últimos meses, e ele não tardou a lhe acompanhar
naquelas cobertas aconchegantes, quando as manchas de sangue já haviam
escorrido de seus dedos.
_____________________________________________________________________________
O caminho para a escola foi tranquilo como sempre, mas Meg
olhava para trás a cada instante, com medo de que algo acontecesse. Ela não
sabia exatamente o que tinha acontecido, mas acordou sabendo que não havia sido
tão cuidadosa. A cadeira havia ficado encostada na parede, ela tinha certeza. E
se alguém que estava naquela sala a tivesse visto indo em direção ao corredor?
Ela balançou a cabeça tentando espantar esses pensamentos.
Estava cansada há meses, e agora, provavelmente havia chegado ao seu limite.
Estava vendo e imaginando coisas. Por mais que a ideia a assustasse, talvez
devesse descansar um dia ou dois antes do vestibular, apenas para parar de ver coisas
que não existiam.
Um pouco mais calma, Meg desviou os seus pensamentos para
seu cronograma de estudos daquele dia. Sua primeira parada seria na biblioteca,
como sempre. A biblioteca era um prédio enorme, isolado nos jardins. O único
prédio fora do complexo escolar. Aquele lugar era fantástico, porém, a
quantidade de horas passadas entre aqueles livros já a angustiava um pouco. Antes
de colocar os pés para dentro da biblioteca, um tipo de angústia diferente
tomou conta dela.
Um calafrio em sua nuca a fez olhar para trás, mesmo sem
pensar no que estava fazendo. Havia um garoto encostado no prédio principal.
Sua postura era descontraída, como se tivesse apenas aproveitando os últimos
instantes de sol antes de suas aulas começarem, porém, a provável causa do seu calafrio
era porque que ele olhava diretamente para Meg. Era claro que ele olhava para
ela. Ele a encarava com uma avidez desconcertante. Quando ele percebeu o seu
olhar, seu semblante mudou um pouco, e, um sorriso malicioso surgiu em seus
lábios.
Meg correu para se refugiar dentro da biblioteca, mas não
tinha nenhuma dúvida do que tinha acontecido.
Aquele garoto estava na noite anterior na sala do jornal, e
sabia que ela também tinha estado ali.
Nenhum comentário:
Postar um comentário