Escrito com sangue (Parte 1/4)

| 18 abril 2015 |
Meg estava praticamente correndo pelos corredores. Ela era provavelmente a única aluna que ainda estava na escola até aquele horário. O vestibular a estava enlouquecendo, ela tinha certeza. Mal se lembrava de comer ou dormir e agora, ao que parecia, não se lembrava nem de ir para casa.

Quando já estava quase na saída, ela percebeu uma movimentação no corredor onde ficava o jornal estudantil. Parecia que aquele pessoal também levava o seu trabalho muito a sério. Meg já ia continuar o seu caminho, quando algo lhe chamou a atenção.

Ela ouviu um ruído baixo, involuntário. O som de alguém provavelmente assustado com algo, tentando segurar as próprias lágrimas. Sem poder se conter, ela seguiu com passos suaves pelo corredor. Todas as salas eram abertas na parte superior, onde terminavam em grandes janelas. Sem saber ao certo o que ocorria, Meg posicionou, em silêncio, uma cadeira perto da parede e subiu, se equilibrando cuidadosamente.

Infelizmente, aquela altura não era suficiente para que ela realmente visse o interior da sala do jornal, mas ela podia ouvir melhor o que acontecia ali dentro. Parecia não haver luz nenhuma acessa, o que ela achou muito estranho. A luz do corredor mal iluminava o lado de fora, quem dirá o lado de dentro.

O choro parecia muito mais alto agora que ela estava bem próxima. Era claramente um garoto que estava naquela situação.  Ela pensou em entrar para perguntar se estava tudo bem, até ouvir uma voz arrepiante, que quase a derrubou da cadeira.

- Você não disse que era isso o que mais queria? Que esse era o seu destino? - Meg sentiu um calafrio percorrer a sua espinha ao ouvir aquela voz assustadora, fria e claramente masculina.

-Eu sei. - Disse o garoto, que agora parecia fazer muito esforço para segurar as lágrimas. - Mas estou com tanto medo, eu não sei mais se quero isso.

- Você sabe a verdade, agora não tem mais volta, ou se junta a nós, ou…

Aquele “ou”, jogado no ar, foi à coisa mais assustadora e misteriosa que ela já tinha ouvido.

O menino que chorava estava sendo ameaçado, isso era óbvio. Ela deveria descer dali e ir atrás do zelador, ou de algum segurança, mas a sua curiosidade a mantinha presa no lugar.

O volume do choro aumentou consideravelmente e, junto com ele, vieram risadas de outras pessoas. Era possível perceber que, além do menino chorão, havia pelo menos mais três pessoas ali dentro. Ou pelo menos havia três pessoas rindo do sofrimento do garoto.

Seu choro foi interrompido bruscamente junto com as risadas. Um grito cortou o ar. Meg sabia que o choro e o grito tinham partido da mesma pessoa. Foi um grito alto e estridente, porém, rápido. Agora, ela não ouvia mais nada além da própria respiração acelerada. Meg queria descer da cadeira, mas suas pernas não obedeciam aos seus comandos. Pareceu uma eternidade até que ela voltou a ouvir algum som. Eles estavam andando até a saída. Meg não fazia ideia do que estava acontecendo, mas tinha certeza que não queria ser a fonte dos próximos gritos.

Com as pernas tremendo, e com mais barulho do que gostaria, ela desceu da cadeira e correu para o corredor que levava em direção as salas de aula. Era mais perto e ela tinha certeza que eles iriam em direção à saída. Com o coração parecendo que iria saltar no peito, ela virou o corredor e se encostou na parede. Só voltou realmente a respirar quando ouviu os passos se afastando, como ela imaginou, em direção a saída. 

Depois de vários minutos, para tentar se acalmar e garantir que eles tivessem partido, ela finalmente voltou pelo mesmo corredor. Não havia mais ninguém ali. A sala do jornal estava aparentemente vazia. Sua curiosidade era irritante, mas ela não conseguia se controlar. Tentou abrir a porta, sem sucesso, porém, havia algo na maçaneta que manchou os seus dedos. Algo que devia estar na mão de quem fechou a porta. Ela aproximou a mão dos olhos para poder ver claramente. Em seus dedos tinha algo vermelho e bem característico, muito parecido com sangue.

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Meg mal percebeu como chegou até a sua casa. Parecia que em um segundo ela estava na escola, e no outro deitada em suas cobertas, ouvindo as batidas rápidas do seu coração. Normalmente ela estaria estudando um pouco, porém, ela não conseguia pensar em mais nada.

Sua mãe ainda não havia chegado em casa. Seus plantões eram imprevisíveis e como Meg também quase não parava em casa, ou estava trancada no escritório estudando, pareciam séculos desde a última vez em que mãe e filha tinham passado algum tempo juntas, mas tudo o que ela desejava naquele momento era poder compartilhar com sua mãe o que havia acontecido.

Por mais que estivesse assustada, o cansaço era seu único companheiro fiel naqueles últimos meses, e ele não tardou a lhe acompanhar naquelas cobertas aconchegantes, quando as manchas de sangue já haviam escorrido de seus dedos.
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O caminho para a escola foi tranquilo como sempre, mas Meg olhava para trás a cada instante, com medo de que algo acontecesse. Ela não sabia exatamente o que tinha acontecido, mas acordou sabendo que não havia sido tão cuidadosa. A cadeira havia ficado encostada na parede, ela tinha certeza. E se alguém que estava naquela sala a tivesse visto indo em direção ao corredor?

Ela balançou a cabeça tentando espantar esses pensamentos. Estava cansada há meses, e agora, provavelmente havia chegado ao seu limite. Estava vendo e imaginando coisas. Por mais que a ideia a assustasse, talvez devesse descansar um dia ou dois antes do vestibular, apenas para parar de ver coisas que não existiam.

Um pouco mais calma, Meg desviou os seus pensamentos para seu cronograma de estudos daquele dia. Sua primeira parada seria na biblioteca, como sempre. A biblioteca era um prédio enorme, isolado nos jardins. O único prédio fora do complexo escolar. Aquele lugar era fantástico, porém, a quantidade de horas passadas entre aqueles livros já a angustiava um pouco. Antes de colocar os pés para dentro da biblioteca, um tipo de angústia diferente tomou conta dela.

Um calafrio em sua nuca a fez olhar para trás, mesmo sem pensar no que estava fazendo. Havia um garoto encostado no prédio principal. Sua postura era descontraída, como se tivesse apenas aproveitando os últimos instantes de sol antes de suas aulas começarem, porém, a provável causa do seu calafrio era porque que ele olhava diretamente para Meg. Era claro que ele olhava para ela. Ele a encarava com uma avidez desconcertante. Quando ele percebeu o seu olhar, seu semblante mudou um pouco, e, um sorriso malicioso surgiu em seus lábios.

Meg correu para se refugiar dentro da biblioteca, mas não tinha nenhuma dúvida do que tinha acontecido.

Aquele garoto estava na noite anterior na sala do jornal, e sabia que ela também tinha estado ali.

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